A pluralidade dos dialetos açorianos

Helena Montenegro
#Chronicle

A variação dialetal insular teve a sua primeira referência em textos da especialidade na Nova Gramática do Português Contemporâneo de Cunha & Cintra (1984), na qual se faz uma apresentação sumária dos dialetos do português europeu, dos dialetos das ilhas atlânticas e dos dialetos brasileiros.

Houve que aguardar pelo século XXI para dispormos de uma classificação mais exaustiva da pluralidade dos dialetos açorianos. Luísa Segura, no I Encontro de Estudos Dialectológicos (Universidade dos Açores, 2003), apresentou uma comunicação intitulada “Dialectos Açorianos – contributos para a sua classificação”. A mesma autora, na Gramática do Português (2013), da Fundação Calouste Gulbenkian, assina uma parte substantiva do capítulo 3, incluindo, em “Variedades dialetais do português europeu”, os dialetos continentais, os dialetos insulares e os dialetos fronteiriços. Os dialetos insulares dividem-se em: dialetos madeirenses e dialetos açorianos. 

Regista-se, assim, a pluralidade, reconhecida por qualquer ouvinte, dos dialetos açorianos. A variedade da maneira de falar o português nas ilhas dos Açores é muito significativa, contudo, entre a grande variedade, há traços comuns que permitem reconhecer 5 grupos: os dialetos de São Miguel; os dialetos da Terceira, Graciosa e São Jorge; os dialetos das Flores e do Corvo; os dialetos de Santa Maria; os dialetos do Pico e do Faial. Esta classificação, proposta por Segura (2003; 2013), assenta em três traços fonéticos: a harmonização vocálica, a metafonia pela vogal final e a supressão da vibrante em final absoluto.

Os dados analisados (Segura, 2003; 2013) permitem concluir que a harmonização vocálica (e.g. três cachos [tréʃ káʃuʃ]; em cacho [e͂j kjáʃu]) dá-se em 4 grupos dialetais, à exceção do grupo dos dialetos micaelenses. Já a metafonia pela vogal final (e.g. carro [kɔR]; gado [gɔd]) e a supressão da vibrante em final absoluto (e.g. lavar [lɐvá]) estão presentes em 4 grupos, não se realizando no grupo dos dialetos do Pico e do Faial. Ainda a partir desta análise, pode-se confirmar o que nos diz o ouvido – os dialetos de São Miguel apresentam um maior afastamento da norma padrão; à ausência total de harmonização vocálica, à metafonia pela vogal final e à supressão da vibrante em final absoluto, acrescenta-se a evolução em cadeia do seu sistema vocálico. Em contrapartida, os dialetos do Faial e do Pico são os que se mantêm mais próximos da norma padrão por não se verificar a metafonia pela vogal final e a supressão da vibrante em final absoluto.

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Helena Mateus Montenegro, doutorada em Linguística Portuguesa, é professora auxiliar da FCSH-UAc. Realiza investigação nas áreas da sintaxe, semântica e léxico. É membro do CEHu (Centro de Estudos Humanísticos). Tem mais de 50 artigos sobre Gramática e Linguística Portuguesa publicados em atas e revistas da especialidade.