Semanas de Estudo dos Açores

Carlos Bessa
#Chronicle

A melhor maneira de esconder alguma coisa é, diz-se, colocá-la diante dos nossos olhos. Pelo que às vezes é preciso que alguém nos recorde que o rei vai nu, para, no meio de tantos afazeres e ocupações, podermos ver.

E se há algo que temos permanentemente diante dos olhos é que os Açores são, de facto, ultraperiféricos. E que, após 45 anos de Autonomia, o desenvolvimento das ilhas é não só diferente entre elas, como, consideradas no seu conjunto, o arquipélago apresenta ainda muitas debilidades em todos os domínios. Opinião esta transversal às diferentes forças políticas, com ou sem assento parlamentar, e, mais importante, transversal às populações das nove ilhas, independentemente de idade, género ou condição social. Ou seja, ainda há muito a fazer. Na educação, na saúde, na economia, na demografia, no desenvolvimento social, na cultura, etc. E quando há muito a fazer, é preciso começar.

Pois bem, para se fazer alguma coisa é necessário saber. E para se saber é necessário estudo. Estudo é um termo com vários significados, como nos mostra qualquer dicionário. Desde logo, o de compreender algo de que se tem um conhecimento rudimentar. Ou o sentido de aplicar o raciocínio lógico sobre determinada matéria.

Ora, há mais de 60 anos, um notável conjunto de professores do Seminário Maior de Angra do Heroísmo fundava um Instituto a que deu o nome de Instituto Açoriano de Cultura. Repare-se que não o designaram de cultura açoriana. Não. Deram-lhe um sentido maior, mais aberto, mais dialogante. Porque já então sabiam que, para se desenvolver uma região, é preciso estudá-la e estar aberto ao mundo. E criaram as Semanas de Estudo. Semanas essas que se caracterizaram desde logo por algo inédito. Pela descentralização, realizando-se em Angra do Heroísmo, na Horta e em Ponta Delgada. Mas também pela necessidade de se criar nos Açores uma consciência de unidade regional e de se refletir sobre o progresso económico e social da Região, tendo em vista o desenvolvimento do arquipélago como um todo. Assim, realizaram-se, cinco Semanas de Estudo entre 1961 e 1965. Que deixaram marcas e de algum modo influenciaram a Autonomia pós 25 de abril.

Por isso, quando nos preparamos para celebrar o seu 50.º aniversário, o Instituto Açoriano de Cultura (Carlos Bessa e Sara Leal), juntamente com Francisco Simões e Nuno Costa Santos, entendeu que havia chegado a hora não só de homenagear quantos se dedicaram às Semanas de Estudo, como de pensar e projetar os Açores para o futuro, refletindo sobre a Autonomia.

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Assim, já a 18 de setembro, teremos em Angra do Heroísmo um painel dedicado à memória, sob o título Que Autonomia quisemos ter, com a presença de Álvaro Monjardino, José Guilherme Reis Leite, Maria Fernanda Enes e Onésimo Teotónio Almeida, num debate que será moderado por Tomé Ribeiro Gomes.

Segue-se, a 2 de outubro, na mesma cidade, o painel dedicado ao futuro, sob o título "Que Açores queremos ter na próxima década?", com a presença de, entre outros, Miguel Monjardino, Pedro Adão e Silva e Renato Carmo, para se falar de emprego, educação, participação política e cívica dos jovens.

A 7 de outubro, na Horta, e a 9 de outubro, em Ponta Delgada, falar-se-á do estado da arte nos Açores, tendo em conta a perspetiva de criadores, curadores, produtores e empresários, para um debate onde se fale das pontes que a Região tem estabelecido ou precisa de estabelecer com a Europa, com a América e com o resto do mundo, bem como das linhas fortes e débeis da produção e divulgação da arte no arquipélago, da presença, ausência e formação de públicos, entre outros aspetos.

Estas novas Semanas de Estudo dos Açores, que partem da sociedade civil e a ela se destinam, pretendem, pois, funcionar como um think tank açoriano, apartidário, descentralizado, arquipelágico, aberto a diferentes públicos e audiências, centrando-se em temas diversos, contando com a participação de variados intervenientes, sejam eles portugueses ou estrangeiros, prevendo que a discussão favoreça a participação de atores políticos de múltiplos quadrantes e lhes permita a definição de melhores políticas. E vai reger-se por um princípio de devolução à sociedade, através de publicações escritas, registos audiovisuais e outros entendidos como relevantes.

A cultura é um conceito vasto e dinâmico, que passa pelo relacionamento dos indivíduos de um grupo, comunidade ou sociedade, e incorpora ideias, códigos, comportamentos, tradições, inovações, experiências, manifestações sociais, atividades artísticas… Razão pela qual este think tank que são as Semanas de Estudo dos Açores está relacionado com um Instituto que ao longo dos seus 66 anos sempre procurou refletir e agir sobre os Açores.


Carlos Bessa 
Presidente da Direção do Instituto Açoriano de Cultura